conteúdo do documento -->

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011


Duas disputas de cinturão, com um brasileiro em cada uma. Um gênio do jiu-jitsu e outro do futebol americano. Realmente não podemos dizer que faltará apelo nas quatro lutas do card principal do Strikeforce San Jose, evento em que a média de idade dos atletas será de 34,3 anos. O americano Nick Diaz coloca seu cinturão dos meio-médios em jogo contra o cascudíssimo brasileiro Evangelista Cyborg. O mito da arte suave Ronaldo Jacaré defende o título dos médios contra o americano Robbie Lawler. O ex-craque da NFL Herschel Walker pega o também veterano americano Scott Carson. Abrindo a transmissão, outro cracaço do jiu-jitsu adentra o hexágono: Roger Gracie encara o sul-africano Trevor Prangley.

Nick Diaz (EUA) vs Evangelista Santos (BRA)
Combate que tem tudo para agradar aos fãs do esporte.

Desde que saiu do UFC em 2006, Diaz acumulou respeitável retrospecto de 12-1, com um no contest. A única derrota desde então foi em 2007 e devidamente vingada na última apresentação contra K.J. Noons, quando defendeu o cinturão pela primeira vez. Costuma fazer lutas empolgantes com seu jiu-jitsu faixa preta de Cesar Gracie e um boxe tão estranho quanto eficiente, além de um fortíssimo condicionamento cardiorrespiratório. E aguenta pancada – condição sine qua non para quem enfrenta Cyborg. Encrenqueiro, maluco, chegado na maconha? Pode ser. Mas é tão bom que até hoje Dana White diz gostar dele. E muitos dizem ser o único capaz de tirar o supercampeão Georges St-Pierre de sua zona de conforto.

Evangelista adquire fãs com o passar dos anos pelo seu estilo porradeiro. Sua luta contra Melvin Manhoef no Cage Rage 15 foi um dos momentos mais memoráveis da história do MMA, um quebra-pau épico que só acabou junto com o gás do brasileiro. Ex-meio-pesado e médio, baixou para a nova categoria no ano passado, quando nocauteou o campeão do DREAM Marius Žaromskis. Membro da Chute Boxe, Cyborg é casado com a campeã dos médios da organização, Cristiane.

A vantagem de 10 centímetros na envergadura, somada ao lançamento de socos que normalmente encontram o endereço certo, são trunfos enormes para o campeão. Sua versatilidade e paciência no chão lhe dão confiança suficiente para não temer este aspecto do jogo. Restaria a Cyborg caçar implacavelmente Diaz pelo hexágono em busca de um nocaute. Mas até esta tática é perigosa. O combate contra Noons mostrou um campeão muito bom no contragolpe, que de um jeito ou de outro encontra um meio de conduzir as lutas a seu favor. A torcida será grande para o brasileiro, mas acho que o cinturão permanecerá nos EUA.

Ronaldo Souza (BRA) vs Robbie Lawler (EUA)
Se o Brasil é azarão na luta principal, os papéis se invertem na disputa dos médios.

Jacaré, na minha humilde opinião, caminha a passos largos na direção de se tornar um dos pesos médios mais completos do MMA mundial. Faixa preta de judô e um dos melhores lutadores de jiu-jitsu da história, nunca precisou provar nada no chão ou nas quedas. Aprimorou seu jogo com um wrestling poderoso, que lhe garantiu a vitória contra Joey Villaseñor. A última luta contra Tim Kennedy mostrou a evolução no campo que faltava: o campeão, parceiro de treino de Anderson Silva, hoje pode dizer que é dono também de um boxe que lhe dá confiança para encarar uma luta de modo completo. Some este arsenal a um estilo agressivo, versátil e com condicionamento físico – antes seu maior problema – em evolução. Está quase pintado o quadro do lutador-modelo.

“Ruthless” Robbie Lawler faz jus ao seu apelido: dono de punhos avassaladores, ele costuma ser implacável contra quem dá bobeira diante dele. Além da capacidade de nocautear com apenas um soco (Melvin Manhoef não nos deixa mentir), Lawler aguenta pancada como poucos (novamente Manhoef está aí para comprovar a teoria). Faz a alegria da torcida pelo seu estilo puro e simples de sair sempre para o pau, não importa contra quem ou por quê.

Este duelo de estilos tem tudo para ser interessante. Ronaldo é mais técnico que Robbie em todas as áreas do jogo, mas em momento algum pode se descuidar. Terá que atuar por 25 minutos na atenção máxima, para não correr o risco de acabar nocauteado. Se a luta for para o chão, será até sem graça. Mas se Lawler se movimentar muito, evitar as transições e encaixar um de seus mísseis, a luta pode ganhar contornos dramáticos e imprevisíveis. Mas acho que vai dar a lógica e Jacaré manterá seu cinturão com mais uma submissão, no segundo ou terceiro round.

Herschel Walker (EUA) vs Scott Carson (EUA)
Walker é daqueles caras que nasceram pro esporte. Ex-estrela do futebol americano, foi atleta olímpico de bobsled e quase disputou os Jogos de verão no revezamento 4×100m. Fez fama por manter o físico perfeito praticamente sem treinar com pesos. Para isso, abusou do taekwondo, muay thai e karatê kempô. Ou seja, pode não saber quase nada de MMA, mas é um atleta de verdade – e forte pra caramba.

Quem diabos é Carson? Sinceramente, não lembro de tê-lo visto em ação. Reza a lenda que o camarada lutou no WEC 1, mas eu nunca assisti ao evento. Fora isso sei que ele tinha 4-0 em 2001 (salve Fight Finder!), quando resolveu se aposentar. Voltou no meio do ano passado, quarentão, para ser nocauteado por alguém tão famoso quanto ele.

Não faço ideia do que Carson possa aprontar. Não conheço seu background (nem sei de ninguém que conheça). Tudo bem, será a segunda luta da carreira de Walker mesmo. Freak show? É o que parece. Mas não é todo dia que a gente vê um coroa de 48 anos com físico de 20 a menos e carisma em ação. Vou torcer por um nocaute de Herschel, sem fazer ideia de como o negócio vá se desenrolar.

Roger Gracie (BRA) vs Trevor Prangley (AFS)
Os mais exaltados enchem a boca para dizer que Roger é decacampeão mundial de jiu-jitsu, entre os 7 títulos na categoria superpesado e os 3 absolutos, além de 2 campeonatos e uma superluta no ADCC, que o tornam o maior campeão da história da arte suave. Já os críticos falam que Roger faz o feijão com arroz, finalizando todo mundo do mesmo jeito. Então digo eu: o que seria isso senão uma prova cabal de genialidade? Mané Garrincha não foi canonizado no futebol por sempre driblar para a direita e ainda assim não ser desarmado? Pois é, Roger Gracie é gênio. Do jiu-jitsu, frise-se.

MMA não é BJJ. Além das quedas, chaves e estrangulamentos, MMA tem soco e chute. É um esporte que costuma crucificar atletas unidimensionais. E este é o grande desafio do brasileiro. Com uma bagagem gigantesca na luta de base, ele quer provar para si e para o mundo que pode ser mais do que o maior competidor da história do jiu-jitsu. Mostrar que é capaz de encarar um esporte tão dinâmico e complexo sem manchar a reputação que o precede. E o Strikeforce vai colaborando com ele.

Gracie estreou no evento contra Kevin Randleman, um adversário de muito nome, muita idade, muita experiência e pouco risco. Aplicou-lhe um mata-leão e acabou a brincadeira. Agora Scott Coker lhe dá Prangley, também com muitos aniversários comemorados (38), muita experiência, menos nome e risco ainda mais baixo. Ex-peso médio, all-american da Divisão I da NCAA na luta universitária, Trevor não é um inútil completo, tampouco alguém que possa tirar o sono de Roger. Dez centímetros mais alto, o brasileiro aprendeu a usar o jab com certa eficiência para garantir distância confortável. Cabe ao sul-africano encurtar para levar o oponente para baixo – e por baixo. Acontece que levar Roger Gracie para baixo é arriscado. Mais cedo ou mais tarde acho que Roger acaba nas costas de Trevor. E aí, meus amigos, só os três tapinhas salvam.
publicado por vitor

Nenhum comentário:

Postar um comentário